QUE IDADE TEM A ESFINGE


PARTE TRES

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ESFINGE E ESTELA Como a discussão sobre a idade da esfinge se desenrola há várias décadas, diversos aspectos têm surgido, sendo que alguns permanecem e outros foram relegados a segundo plano. Um dos aspectos relegados é o da estela que Tutmósis IV (c. 1401 a 1391 a.C.) mandou fixar na frente do monumento e que apresenta uma inscrição danificada na qual surge a primeira sílaba do nome de Kéfren. Quando ela foi escavada pela primeira vez em 1818, muitas das linhas da parte inferior do texto em hieróglifos haviam sido perdidas como resultado do desgaste do granito no qual o estela foi esculpida. Numa das linhas inferiores remanescentes, mas altamente fragmentada, alega-se que estavam presentes os hieróglifos Kha-f, o sol surgindo por trás de uma colina {kha} e a víbora cornuda {f}, envoltos por um cartucho quebrado. A presença desse cartucho identificaria os sinais como o nome real de Kéfren, pois faltaria apenas o hieróglifo para a sílaba re. Entretanto, atualmente se afirma que, na realidade, nenhum cartucho existia e, por conseqüência, este texto nunca se referiu àquele faraó. Infelizmente, como resultado de desgaste posterior, a discutida linha de texto hoje se encontra completamente perdida. Existe, porém, um meticuloso desenho feito pelo arqueólogo Henry Salt e publicado em 1840, após sua morte, que mostra a linha de texto e nela se inclui o cartucho. Apesar de tudo, o texto quebrado não faz referência a Kéfren como o construtor da esfinge. O texto foi tão danificado que o motivo pelo qual existe a referência a Kéfren permanece completamente obscura.

Outra estela, essa de Amenófis II (c. 1427 a 1401 a.C.), também foi achada dentro dos muros que circundam a esfinge pelo arqueólogo Selim Hassan, durante extensas escavações que realizou em Gizé nas décadas de 30 e 40 do século XX. Essa estela é interessante para o debate sobre a esfinge porque menciona Kéfren e Kéops, mas sem nenhuma referência aparente a qualquer dos dois como criadores do monumento. Hassan, em 1946, escreveu no relatório sobre suas escavações:

Levando todas as coisas em conta, parece que nós temos que dar a Kéfren o crédito de erguer a estátua mais maravilhosa do mundo, mas sempre com esta reserva de que não há nenhuma inscrição contemporânea que ligue a esfinge a Kéfren e, ainda que soe estranho, nós temos que tratar a evidência como circunstancial, até o momento em que um movimento afortunado da pá do escavador revele para o mundo uma informação definitiva sobre a construção da esfinge.
Esse cientista livrou o monumento da areia que o recobriu por milênios. Teve acesso sem igual à estratigrafia dos escombros acumulados e às evidências arqueológicas em seu próprio contexto. Tal circunstância não esteve disponível aos investigadores subseqüentes. Apesar de uma riqueza de achados, Hassan não conseguiu atribuir a esfinge a qualquer faraó específico.

Existe ainda uma terceira estela que entra nessa história. A assim chamada Estela do Inventário, descoberta pelo arqueólogo francês Auguste Mariette, informa que a esfinge já existia no tempo de Kéops. Acontece que tal estela é um artefato datado da XXVI dinastia (664 a 525 a.C.) e pode até mesmo ser uma fraude piedosa daquela época. Ela afirma que Kéops encontrou a esfinge em ruínas e mandou restaurá-la. A execução da peça é de má qualidade e os nomes das divindades que nela aparecem são aqueles empregados durante o Período Tardio (c. 712 a 332 a.C.). Talvez ela seja apenas uma tentativa fraudulenta por parte dos egípcios daquela época de re-descobrir um passado que para eles já era muito antigo. Mas também existe a possibilidade que ela seja cópia de um documento mais velho. Houve precedentes nessa prática: um faraó da dinastia anterior, Shabaka (c. 712 a 698 a.C.), mandou gravar em granito um texto que encontrara deteriorado em madeira ou papiro. Além disso, a Estela do Inventário refere-se ao fato da parte posterior do nemes da esfinge haver sido atingida por um raio. Arqueólogos confirmam que realmente há dano nesse local, consistente com um forte impacto, bem como vestígios aparentes de trabalho de um antigo reparo.

Um eminente arqueólogo da atualidade, Mark Lehner, identificou dois tipos de alvenariaESFINGE DESENHADA POR DAVID ROBERTS restauradora na esfinge. O tipo mais antigo consiste de grandes blocos de pedra calcária colocados diretamente sobre a pedra calcária original que forma o núcleo do monumento. Esses blocos maiores foram então sobrepostos por uma segunda camada de pedras calcárias do tamanho de tijolos. Lehner considerou inicialmente que a alvenaria mais antiga havia sido colocada como parte da construção original na IV dinastia (c. 2575 a 2465 a.C.) e tinha por objetivo corrigir qualquer descontinuidade natural na pedra calcária do núcleo. Para demonstrar esse ponto-de-vista, ele procurou vestígios de marcas de ferramentas na pedra calcária do núcleo que está por baixo dos blocos de pedra calcária maiores. Entretanto, ele descobriu que esse núcleo parece ter sofrido severa erosão antes mesmo dos primeiros grandes blocos de pedra terem sido instalados. Na tentativa de reconciliar tal descoberta com o estabelecimento da IV dinastia como data de construção da esfinge, Lehner passou a atribuir a aplicação dos grandes blocos de pedra a uma restauração feita por Tutmósis IV. Colin Reader acha que se aceitarmos uma revisão da sequência dos acontecimentos na qual a origem da esfinge se situe antes da IV dinastia, será possível reconciliar a severa erosão apontada por Lehner com uma restauração muito mais remota do monumento, a qual teria sido feita no Império Antigo (c. 2575 a 2134 a.C.). O Dr. Zahi Hawass, o mais importante arqueólogo do Egito, confirmou recentemente que deve ter havido tal restauração naquele período. O debate prossegue e, sem dúvida, outros pontos controversos surgirão com o passar dos anos.