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COVA FUNERÁRIA

O túmulo para um egípcio antigo era o seu castelo da eternidade e deveria durar para sempre. Eles acreditavam que a sobrevivênvia após a morte dependia em primeiro lugar da preservação do corpo físico. Além disso, todo material que se fazia necessário para o corpo e para o ka do morto deveria ser suprido ao longo dos anos após a morte. Tais crenças levaram os antigos egípcios a dedicarem atenção especial à edificação de seus túmulos. E embora o formado dos sepulcros possa ter mudado ao longo do tempo, seu propósito fundamental permaneceu o mesmo ao longo dos 3000 anos da história egípcia.

No período pré-dinástico, ou seja, anterior ao ano 2920 a.C., os corpos eram enterrados em covas retangulares ou ovais cavadas na areia. O cadáver era colocado de lado, numa postura fetal, enrolado numa esteira de junco e ao seu redor eram dispostos alguns pertences pessoais como pulseiras, colares, instrumentos de caça e vasos contendo comida e bebida. Às vezes tais sepulturas eram revestidas com pranchas de madeira unidas nos cantos por meio de tiras de couro, formando uma espécie de caixão ao redor do corpo. A areia ardente e seca conservava naturalmente o corpo. O calor da areia absorvia a umidade, sem a qual as bactérias não podiam proliferar e provocar a decomposição. Essa forma humilde de sepultamento, ironicamente, preservava o corpo em melhores condições do que o mais elaborado dos túmulos e as mais custosas técnicas de mumificação.

Por cima de tais sepulcros não existia, provavelmente, nenhum tipo de construção, a não ser, talvez, um monte de areia escorado lateralmente por estruturas de madeira. É claro que a fragilidade desse esquema permitia que a areia se dissipasse e que o cadáver e seus pertences ficassem muitas vezes expostos e se danificassem ou até mesmo se destruissem, caso não fossem novamente enterrados, o que raramente ocorria.

No início da era dinástica os faraós e os nobres da corte procuraram evitar MASTABASa destruição de seus túmulos, construindo sobre eles uma estrutura que ficou modernamente conhecida com o nome de mastaba (foto ao lado). Essa forma evoluiu no decorrer da III dinastia — no que se refere aos faraós — para a pirâmide de degraus e, na dinastia seguinte, para a pirâmide verdadeira. Dois fatores importantes influenciaram o desevolvimento da arquitetura das primitivas sepulturas egípcias: a necessidade de prover proteção suficiente para o corpo e a crença de que a tumba deveria suprir seu proprietário com as necessidades básicas do além-túmulo.

A egiptologia tradicional afirma que as pirâmides, a despeito das diversas teorias existentes, nada mais eram do que túmulos dos faraós. Os argumentos apresentados são o fato de todas elas conterem sarcófagos e estarem situadas na margem oeste do Nilo, onde tradicionalmente os egípcios enterravam seus mortos. Além disso, eram edificadas em grupos e faziam parte de um amplo cemitério que incluia templos mortuários e túmulos de membros da família real, de cortesãos, de numerosos sacerdotes e oficiais. O interior da Grande Pirâmide, por exemplo, sustenta a arqueologia clássica, é formado apenas por um meio de acesso e pela câmara funerária propriamente dita. Nessa, o teto em ponta e as lajes de granito que o formam visam apenas suportar o enorme peso que se abate sobre ele. A passagem que leva à câmara funerária amplia-se na sua parte superior para permitir que a estreita passagem de acesso à câmara pudesse ser selada com gigantescas portas levadiças. O desenho do interior do monumento apenas parece complicado porque seu projeto foi alterado várias vezes durante a construção. Os assim chamados "condutos de ventilação" podem ter sido concebidos como meio simbólico de saída para o espírito do faraó morto.

Os estudos arqueológicos sugerem que as diferentes estruturas edificadas sobre os túmulos eram entendidas como símbolos do monte primevo que emergiu das águas do caos quando o mundo foi criado. Acreditava-se que naquele monte — ensina o arqueólogo I.E.S.Edwards — Atum, o deus da criação, havia se manifestado pela primeira vez e criado o universo. Ele é, portanto, o símbolo da existência, em oposição à não existência e, consequentemente, quando colocado sobre a sepultura ou incorporado à tumba, imaginava-se que pudesse servir como uma potente fonte de magia pela qual o morto poderia esperar receber a renovação da existência.

Estudiosos sugeriram que todas as pirâmides, escalonadas ou não, eram representações monumentais do monte primevo, mas há também quem diga que o simbolismo foi mudando e, em consequência, o formato dos túmulos foi sendo alterado. Assim, embora as mastabas talvez representassem realmente o monte primevo, já a pirâmide de degraus de Djoser teria outro significado. Os textos das pirâmides sugerem que uma das diferentes maneiras pelas quais o rei morto poderia atingir os céus seria por meio de uma escada. Uma de tais inscrições afirma:

Uma escada para o céu foi colocada para ele [i.e. o rei], de forma a que ele
pudesse subir aos céus através dela.

Pela lógica egípcia, um modelo incorporava as propriedades mágicas atribuídas ao objeto que representava. Assim sendo, através da pirâmide o rei estaria habilitado a subir aos céus e a retornar ao túmulo quando desejasse, para usufruir das oferendas deixadas por seus familiares e pelos sacerdotes.

O egiptólogo J.H. Breasted disse o seguinte a respeito da importância das pirâmides:PIRÂMIDES DE GIZÉ À LUZ DO SOL
A forma piramidal do túmulo real tem o mais relevante significado religioso. O rei era enterrado sob o próprio símbolo do deus-Sol, que ficava no santo dos santos do templo do Sol em Heliópolis, um símbolo sobre o qual, desde o dia em que criara os deuses, ele estava acostumado a se manifestar sob a forma de uma fênix; e quando em proporções montanhosas a pirâmide erguia-se acima da sepultura do rei, dominando a cidade real abaixo e o vale adiante por muitas milhas, era o mais alto objeto a saudar o deus-Sol em toda a terra e seus raios matinais resplandescendo em seu brilhante cume bem antes dissipava as sombras nas moradas dos humildes mortais abaixo. Frequentemente os textos das pirâmides descrevem o rei ascendendo aos céus nos raios do Sol. Um trecho diz o seguinte:

Eu trilhei estes teus raios como se fossem uma rampa sob meus pés
e por ela subi até minha mãe, o Uraeus vivo da testa de Rá.

Outra inscrição diz:
Os céus solidificaram para ti os raios do Sol,
para que tu possas ascender aos céus como o olho de Rá.

Parece, assim, que as pirâmides verdadeiras poderiam ser — na ótica egípcia — uma representação material dos raios do Sol e, consequentemente, um meio pelo qual o rei morto pudesse subir aos céus. Elas teriam, portanto, um propósito prático, bem de acordo com a praticidade inerente ao espírito do povo egípcio. Aqui, como no caso das pirâmides escalonadas, o que estava por trás de tudo era a idéia de que modelos representavam objetos reais. E um modelo, — esclarece I.E.S.Edwards — quer fosse a estátua de pedra de uma pessoa ou uma cena esculpida em relevo, era considerado possuidor de todas as virtudes do objeto real que representava. O tamanho não era um fator de importância primordial para a eficácia do substituto e essa pode ter sido uma das razões para o rápido declínio das dimensões das pirâmides após os tempos de Kéops e Kéfren.