QUE IDADE TEM A ESFINGE

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ESFINGE EM 1850

Uma equipe de geólogos e pesquisadores descobriu evidências físicas de que a Esfinge de Gizé pode ter sido erguida no período entre 7000 e 5000 anos anteriores a Cristo. Talvez, até mesmo antes. Inúmeros arqueólogos discordam dessa opinião. Para eles a esfinge foi construida durante o reinado do faraó Kéfren (c. 2520 a 2494 a.C.). Acima a esfinge como desenhada pelo artista W. H. Bartlett por volta de 1850.

A idéia de que a esfinge pode ser mais antiga do que se pensa realmente não é nova. Alguns egiptólogos antigos e proeminentes que escavaram no planalto de Gizé acreditavam que a esfinge e seus templos circunvizinhos eram anteriores ao período da IV dinastia (c. 2575 a 2465 a.C.). O arqueólogo britânico E. A. Wallis Budge foi um deles. Em livro publicado em 1904, declarou: Este objeto maravilhoso [a Grande Esfinge] existia na época de Kéfren e é provável que seja muito mais velha do que o reinado dele e que date do fim do período arcaico. Por sua vez, Gaston Maspero, egiptólogo francês e Diretor Geral de Escavações e Antiguidades do governo egípcio no início do século XX, inspecionou a esfinge na década de 1920 e afirmou: A estela da esfinge mostra, na linha treze, o cartucho de Kéfren. Eu acredito que para indicar uma escavação levada a cabo por aquele príncipe, o que parece ser a prova quase certa de que a esfinge já estava enterrada na areia no tempo de Kéfren e de seus antecessores.

Entre 1937 e 1952, um erudito francês, R.A. Schwaller de Lubicz, empreendeu uma pesquisa do Templo de Luxor. Suas medições trouxeram à luz relações geométricas insuspeitadas. Seus dados desafiavam a noção da inferioridade matemática dos egípcios e sugeria uma nova dimensão para as crenças religiosas daquele povo. Na sua visão, a egiptologia clásica havia dado uma interpretação excessivamente primitiva para a ciência e a religião egípcia. Ele especulava que os antigos egípcios teriam obtido o cerne de seu conhecimento de uma civilização perdida anterior, ou de um estágio perdido de sua própria civilização, datados de uma época pré-histórica. Mas Schwaller incitou oposição pelos significados especulativos que ele atribuiu às inscrições e à arquitetura egípcia e outros eruditos desprezaram suas descobertas. Schwaller notou uma anomalia física curiosa no complexo das pirâmides de Gizé. Ele percebeu que a erosão da esfinge era bastante diferente da erosão observável em outras estruturas. Sugeriu, então, que a causadora de erosão na esfinge teria sido mais a água do que a areia arremessada pelo vento. Naquela ocasião ninguém percebeu as implicações dessa afirmação e ela passou despercebida.

Em 1970, John Anthony West, um egiptólogo independente, retomou a questão. A esfinge não seJOHN ANTHONY WEST assenta sobre o planalto de Gizé, mas jaz no centro do que parece ser os restos de uma antiga pedreira. Apenas sua cabeça e o topo de suas costas projetam-se sobre a elevação geral do planalto circunvizinho. Na realidade o monumento não foi erguido sobre o solo, mas cavado no leito de rocha de pedra calcária. Para esculpir o corpo do leão, os antigos egípcios cavaram um fosso ao seu redor de tal maneira que a figura encontra-se agora em um buraco ou depressão. O que hoje em dia forma a cabeça da esfinge foi outrora, provavelmente, a ponta de uma rocha que se sobressaia acima do terreno. O resto foi escavado na pedra calcária subterrânea do planalto de Gizé, criando, em conseqüência, uma área rebaixada e murada ao seu redor. Um pequeno templo, conhecido como Templo da Esfinge, situa-se na frente do animal. Ele e um templo adjacente, à direita da esfinge, conhecido como Templo do Vale de Kéfren, ficavam originalmente junto ao rio Nilo. Esse Templo do Vale encontra-se na extremidade de uma longa calçada de 487 metros de comprimento, o qual leva ao Templo Mortuário situado diante da pirâmide de Kéfren. O Templo da Esfinge e o Templo do Vale são formados por enormes blocos de pedra calcária tiradas do próprio local escavado e revestidos com granito de Assuão. West comparou a erosão na esfinge, nos templos e nas paredes dos muros circundantes com a erosão de outras estruturas no planalto de Gizé. Na esfinge e nos muros próximos, a rocha foi seriamente danificada e dá sinais de desmoronamento. As extremidades estão arredondadas e profundas fissuras chamam a atenção do observador. Nas demais estruturas do planalto, as superfícies mostram apenas a acentuada abrasão do vento e da areia.

O Egito experimentou períodos de pesadas chuvas nos milênios que marcaram o deslocamento pós-glacial da zona temperada em direção ao norte. Tal período durou de 10000 a 5000 a.C. e no seu final o Saara tinha se transformado de savana verde em um deserto. Outra época ainda mais intensa de chuvas, embora mais curta, ocorreu de 4000 a 3000 a.C., com as precipitações diminuindo na metade do terceiro milênio. John West acredita que as inundações durante a transição pós-glacial causaram o desgaste diferenciado no complexo da esfinge, o que significa que esse monumento deve ter sido esculpido durante ou antes da transição. Os arqueólogos, de modo geral, recusaram-se até mesmo a analisar a hipótese de West. Em 1990 ele persuadiu um geólogo da Universidade de Boston, Robert M. Schoch, a examinar a questão e ambos visitaram o planalto de Gizé em junho daquele ano. Convém esclarecer que não houve concordância total entre as opiniões de West e Schoch.

Arqueólogos concordam entre si que já ocorreram inundações do Nilo que atingiramPAREDE SUL DO MURO a base da esfinge no passado. Entretanto, os níveis das inundações declinaram desde a época do Império Antigo (c. 2575 a 2134 a.C.). Schoch observou que a erosão era maior nas partes superiores da esfinge e dos muros circundantes, não ao redor da base onde a inundação deveria ter cortado o monumento por baixo. Além das diferenças entre as camadas das rochas, desigualdades na estrutura geológica dentro das camadas da pedra afetam os perfis de desgaste da rocha. Embora as superfícies horizontais roliças da esfinge reflitam a durabilidade variável das subcamadas no corpo principal, a tendência destas subcamadas de serem mais duráveis na medida em que sobem deveriam ter produzido um perfil global menos desgastado também na medida em que o monumento e os muros circundantes se elevam. Ao invés disso, Schoch observou que os muros e a esfinge mostram um perfil profundamente mais desgastado na parte superior do que na parte inferior da camada da pedra calcária. O desgaste na parte superior do monumento, o padrão ondulado dos danos e as fissuras da esfinge e dos muros ao seu redor, como pode ser observado na foto acima, são típicas de estrago provocado pela chuva. Ele escreveu: A esfinge mostrou um pouco de erosão pelo vento, particularmente na cabeça e na parte superior das costas, que se situam sobre o nível do solo do planalto. Entretanto, a esfinge também mostra um óbvio e extenso desgaste provocado por precipitação. Rocha corroída pela chuva tem uma superfície ondulante, exibindo freqüentemente fendas verticais bem visíveis. Este tipo de erosão está bem desenvolvido e proeminente no corpo da esfinge e dentro da área que a cerca, onde o desgaste alcança de um a dois metros de profundidade abaixo da superfície. Embora seja certo que as estruturas de Gizé são construídas do mesmo tipo de pedra calcária usada na esfinge, nenhuma delas mostra o mesmo grau de desgaste induzido pela precipitação.

Schoch defende que nem a subida e a descida dos lençóis de água, nem qualquer outro processo subterrâneo de milhões de anos de duração, produz habitualmente o tipo de perfil visível nas paredes. Este tipo de perfil está, em seu modo de ver, normalmente associado ao desgaste pela ação física de água na superfície da rocha. Mas ele diz também que a natureza e, especialmente, o grau de desgaste visto nos muros que cercam a esfinge e no corpo da própria esfinge é incompatível com enchentes repentinas e esporádicas ocorridas desde os tempos dinásticos. Ele também não acredita que tenha havido chuva suficiente na área durante os últimos 5000 anos para causar a tremenda degradação do leito de rocha calcária que se vê atualmente no extremo ocidental do muro e muito menos para provocar o extremo desgaste e erosão que pode ser vista no núcleo do corpo da própria Esfinge. E mesmo que tais chuvas tivessem existido, o monumento esteve protegido delas, pois passou enterrado na areia durante 3100 dos últimos 4500 anos. De tempos em tempos a areia era retirada e a parte superior do monumento reaparecia, mas apenas a cabeça da esfinge parece ter estado sempre exposta.

Schoch também comparou o desgaste no leão com o desgaste na parte externa da tumba deTUMBA DE DEBEHEN Foto © Jon Bodsworth Debehen, vista na foto ao lado, cavada na rocha e situada cerca de 900 metros além dos muros que cercam a esfinge. Identificou a fachada da tumba como sendo do mesmo tipo de rocha que forma o corpo principal da esfinge. Nesta última podem ser vistos profundos arredondamentos da pedra, enquanto o exterior da tumba mostra um perfil mais denteado e angular que ele atribuiu aos efeitos de areia soprada pelo vento. Em síntese, a erosão pelo vento e pelas chuvas causaram diferentes efeitos no mesmo tipo de pedra. Mais ainda, o geólogo notou que os blocos de pedra calcária da esfinge e no Templo do Vale de Kéfren encontram-se erodidos de forma similar e que algumas das pedras graníticas de revestimento parecem ter sido encaixadas com exatidão nos blocos calcários desgastados que estão por trás delas. Ele escreveu: Baseado em minhas observações de campo do granito de revestimento e dos blocos de pedra calcária subjacentes, acredito que os blocos do núcleo em ambos os templos foram expostos aos elementos e sofreram erosão e desgaste considerável antes dos revestimentos de granito serem colocados. Em certos lugares a parte de trás dos blocos de granito estava cortada em padrões ondulados irregulares, de forma a complementar ou se encaixar nos padrões irregulares de desgaste dos blocos de pedra calcária que pretendem recobrir. Observando o Templo do Vale em particular, também se nota que as paredes de pedra calcária, em lugares que perderam o revestimento de granito, não foram suficientemente alisadas. Ao contrário, elas têm um padrão de superfície altamente irregular. Aparentemente os antigos egípcios, antes de aplicar os revestimentos de granito de Assuã, cortaram e alisaram superficialmente a superfície desgastada das paredes, mas não retiraram o suficiente desta superfície desgastada para tornar as paredes perfeitamete lisas.

Antigas inscrições sugerem que as pedras de revestimento datam do Império Antigo, aventando a hipótese de que as paredes calcárias originais já lá estavam e foram danificadas muito tempo antes.
A comunidade egiptológica — prossegue Schoch — concorda que o revestimento de granito da esfinge e dos templos do vale deve ser atribuído a Kéfren. No local eu encontrei uma inscrição cavada no granito do Templo do Vale que parece, em termos estilísticos, ser da época do Império Antigo. Parece lógico supor que os blocos de pedra calcária do núcleo tivessem sido cortados recentemente, ou seja, não estivessem desgastados, quando foram originalmente usados na construção da esfinge e dos templos a ela associados. Então, se os revestimentos de granito cobrem pedra calcária profundamente desgastada, as estruturas de pedra calcária originais devem preceder, em grau considerável, a seus respectivos revestimentos de granito. Obviamente, se a pedra calcária do núcleo (originária do fosso da Esfinge) é anterior ao granito do revestimento e este último é atribuído a Kéfren da IV dinastia, então a Grande Esfinge foi esculpida antes do reinado daquele rei.

Em 1991 West e Schoch solicitaram ajuda a Thomas L. Dobecki, um geofísicoESFINGE VISTA POR TRÁS texano, que efetuou uma pesquisa sísmica na frente dos muros que rodeiam a esfinge para determinar se a rocha subjacente mostrava ou não evidência de danos causados pelas chuvas. Os testes demonstraram que o solo abaixo da área que fica na frente e nas laterais da esfinge havia sido desgastado até uma profundidade de dois metros e 50 centímetros. Por sua vez, na área da parte posterior do monumento o desgaste atingiu só a metade dessa profundidade. Schoch comentou a esse respeito: Estes resultados eram completamente inesperados. A mesma pedra calcária cerca a grande escultura e se o corpo inteiro da esfinge fosse esculpido na rocha viva num único momento, seria esperado que a pedra calcária circunvizinha mostrasse a mesma profundidade de desgaste subterrâneo. O desgaste do subsolo é essencialmente uma modificação mineralógica e petrológica que ocorre nas pedras tão logo a superfície da rocha seja exposta ao ar, não importando qual seja o clima. Teoricamente a profundidade do desgaste está relacionada e é diretamente proporcional ao período de tempo durante o qual a superfície ficou exposta e, portanto, sujeita à chuva, à penetração da água e à evaporação da mesma. A conclusão foi a de que o solo por trás da esfinge foi escavado durante o Império Antigo, para se criar uma passagem que não existia atrás do monumento, mas que as laterais e a parte frontal do animal seriam duas vezes mais antigas. Em síntese: a parte dianteira da esfinge teria sido escavada bem antes da traseira. O copyright da foto acima é de Jon Bodsworth.

Schoch acredita que caso a esfinge não fosse anterior ao Império Antigo, deveria exibir uma aparência mais denteada e não o perfil de desgaste mais arredondado que é visível na parede do muro ocidental e no extremo ocidental da parede do muro sul. Ele pensa que as chuvas pesadas do final do período pré-histórico produziram os perfis arredondados na esfinge e nos muros circundantes. Ressalta que as mastabas de adobe de Saqqara, datadas de 2800 a.C., aproximadamente, não mostram qualquer evidência de significativo desgaste pela chuva, indicando quão seco foi o clima durante os últimos 5000 anos. Ele acredita que as características do desgaste na esfinge e nos muros que a circundam indicam uma data muito anterior a 3000 ou 2800 a.C para sua construção. Ele duvida que a quantidade, o tipo e o grau da erosão induzida pela chuva que se vê nos muros ao redor do monumento tenham sido produzidos em apenas alguns séculos.

Talvez, inicialmente, só as laterais e a frente do corpo da esfinge tivesse sido esculpido e aESFINGE ENTERRADA escultura se projetasse como um outeiro da pedra circunvizinha, com a parte que se tornaria mais tarde a anca da figura ainda fundida com a pedra natural, mais ou menos como aparece nesta foto de 1867. Talvez, como sugeriu o egiptólogo egípcio Selim Hassan, a esfinge tivesse sido projetada originalmente para ser vista apenas de frente. Dessa maneira, com o templo à sua frente, pareceria estar assentada sobre um pedestal. No entender de Schoch, assim que as laterais e a frente do monumento foram esculpidos, a pedra calcária do pavimento que cerca estes três lados da escultura começou a se desgastar; mas o que se tornaria o chão de pedra calcária atrás da figura ficou ainda protegido por uma grossa camada de pedra sólida, o que explicaria os resultados da pesquisa sísmica. Uma hipótese razoável, segundo ele, é a de que quando Kéfren reparou e remodelou a esfinge e seus templos, ele libertou a parte de trás da colossal escultura da escarpa na qual se inseria. Assim, neste momento e só nesse momento, o chão de pedra calcária no parte posterior da figura começou a se desgastar.

Considerando uma taxa linear de desgaste, Schoch estimou a data da esfinge e da maior parte dos muros circundantes entre 5000 e 7000 a.C. Ele também afirmou que o desgaste pode não ter sido linear, reduzindo sua velocidade à medida em que se aprofundava em função do aumento da massa de rocha. Nesse último caso a esfinge poderia ser bem anterior a 7000 a.C. Mas, como outros fatores climáticos podem ter contrabalançado o fato do desgaste não ser linear, ele acabou aceitando as datas citadas como o provável período da construção do monumento. A objeção que aqui se apresenta é que não se conhece a taxa de desgaste da pedra com o passar dos anos e esta incerteza torna altamente especulativa a estimativa da idade da rocha. Schoch argumenta, porém, que diferentes tipos de desgaste podem ser identificados no complexo da esfinge, os quais podem ser correlacionados com períodos de clima e estes, por sua vez, podem ser datados de forma aproximada.

Robert M. Schoch pondera que a uns 8000 anos atrás a esfinge pode ter sido diferente daquilo que é hoje. Os detalhes originais da superfície do corpo se perderam pela ação do tempo num passado distante e a cabeça atual do figura é, quase com certeza, resultado de remodelagem. Ele acha que a evidente desproporção entre o pequeno tamanho da cabeça e a enormidade do corpo sugerem que a cabeça pode ter sido originalmente a de um leão, posteriormente refeita para assumir a semelhança com um faraó. Isto implica que os reis egípcios teriam sido herdeiros de uma estrutura já existente a qual refizeram à sua própria imagem para se apropriarem do monumento. Certamente a esfinge foi objeto de muito trabalho, consertos, renovações e abusos desde os tempos pré-históricos até o presente. Atenção especial parece ter sido dada a ela periodicamente: durante o Império Antigo (c. 2500 a.C.), nos tempos do Império Novo (c. 1400 a.C.), na XXVI dinastia (664 a 525 a.C.) e durante o Período Greco-Romano (332 a.C. a 395 d.C.). Durante tais períodos de reparação, o soberano da época frequentemente teve que desenterrá-la da areia que, em questão de décadas, a recobriria se as devidas providências não fossem tomadas. Após cada desenterrar da figura, reparos com argamassa eram feitos nas partes danificadas na tentativa de restaurar a escultura ao seu perfil original.

A egiptologia clássica acredita que o monumento faz parte do complexo funerário construído por Kéfren. Ele inclui a esfinge e os Templos do Vale, uma calçada, e a segunda pirâmide. Ambos os templos exibem o mesmo estilo arquitetônico, empregando pedras que pesam até 200 toneladas. Geralmente é aceito que os templos, em conjunto com a esfinge, fizeram todos parte da mesma pedreira e do mesmo processo de construção. Alguns indícios costumam ser apresentados para situar a construção da esfinge no tempo de Kéfren. A estela que Tutmósis IV (c. 1401 a 1391 a.C.) mandou fixar na frente do monumento apresenta uma inscrição danificada na qual surge a primeira sílaba do nome de Kéfren. Uma estátua de diorito desse faraó descoberta enterrada de cabeça para baixo junto com outros escombros em seu Templo do Vale, por causa de sua relativa proximidade com a esfinge, também parece associar todo o complexo de construções ao nome dele.

Tem sido afirmado pelos egiptólogos que a cabeça da esfinge reproduz as feições de Kéfren.CLOSE DA ESFINGE Schoch afirmou que essa é uma noção relativamente recente e está longe de ser verdadeira. O rosto da esfinge está severamente danificado, mas o que resta dele, indiscutivelmente, não parece assemelhar-se à face vista nas estátuas conhecidas de Kéfren. Para elucidar esse ponto, West recorreu ao trabalho do detetive Frank Domingo, um perito da polícia de New York. Ele fez uma análise detalhada do rosto da esfinge, comparando-o com o que se conhece da cabeça de Kéfren. Foram geradas análises manuais e computadorizadas das duas cabeças e se concluiu que a estrutura facial é muito diferente nos dois casos. O perito afirmou, de forma categórica, que a face da grande esfinge não é a mesma face vista nas estátuas do construtor da segunda grande pirâmide. Do ponto de vista artístico, a evidência mais forte para datação do monumento é o enfeite na cabeça da estátua. Ele pertence claramente ao período dinástico, embora haja alguma incerteza sobre de qual reinado seria. A desproporção entre o tamanho da cabeça e o tamanho do corpo pode ser explicada pela fissura principal na parte de trás do monumento, a qual exigiu que o comprimento da estátua fosse estendido para estabilizar sua porção traseira.

Como vimos, antes de West levantar a questão já havia alguma incerteza sobre a data da construção do monumento. Os arqueólogos concordam que foram feitos trabalhos de reparação para preencher fissuras ou proteger áreas corroídas do monumento durante o Império Novo (c. 1550 a 1070 a.C.), em data não posterior a 1400 a.C. Isso daria pouco mais de um milênio para que a erosão da enigmática figura atingisse tais proporções a ponto de requerer medidas reparadoras. Durante a maior parte desse tempo, provavelmente, o corpo da esfinge esteve enterrado na areia.

Como era previsto, surgiram várias objeções à teoria de John West por parte de alguns geólogos, enquanto outros o apoiaram integralmente. Um geólogo propôs que a esfinge inteira — e não apenas sua cabeça — tivesse sido uma rocha que se sobressaia acima do terreno. Ela poderia ter sido corroída durante milênios antes de ter sido esculpida. West argumentou que o corpo da esfinge e os blocos dos templos adjacentes seguem o padrão de estratificação do leito de rocha escavado. Eles foram claramente esculpidos diretamente do planalto, bem como os muros circundantes. Apenas a cabeça deve ter sido uma rocha que se sobressaia do terreno. Por sua vez, Robert Schoch acredita que a cabeça, muito pequena em relação ao corpo, foi provavelmente esculpida a partir de uma cabeça de leão, a qual, anteriormente, teria formado o topo da esfinge. Essa parte até pode ter sido originalmente uma pequena colina, mas foi tão profundamente modificada por modelagem e remodelagem que não se pode ter certeza sobre esse ponto.

Ainda do ponto de vista geológico, os argumentos contrários dos cientistas atribuem a erosão na esfinge principalmente a efeitos geoquímicos associados ou com a elevação do lençol de água subterrâneo, ou com a condensação e evaporação atmosférica, a qual ocorre mesmo no clima seco daquela área. Em outras palavras, mecanismos que não a chuva explicariam o desgaste da esfinge. O monumento se deterioraria de forma diferente dependendo do fato de estar exposto ao ar ou enterrado na areia. Quando exposto ao ar, o monumento se deterioraria como resultante de efeitos químicos associados com a condensação da umidade atmosférica na rocha pela manhã. O orvalho formado à noite na pedra calcária exposta remove sais solúveis da superfície da rocha. Forças capilares puxam esta solução para dentro dos poros da pedra, onde mais sais são dissolvidos das paredes internas dos poros. Com o aumento das temperaturas durante o dia, a solução começa a evaporar, precipitando cristais do sal dentro do limitado espaço dos poros. A pressão que os cristais exercem, na medida em que crescem, produz a formação de escamas que acabam se desprendendo das camadas finas da rocha na superfície da pedra calcária. Removida a pedra enfraquecida pela ação física do vento, pedra nova fica exposta ao desgaste. QuandoCORNELIS enterrado, os mesmos efeitos químicos ocorreriam pelo contato com a umidade de chuvas intermitentes e inundações ocasionais absorvida pela areia e é sabido que a esfinge permaneceu enterrada na maior parte de sua existência conhecida. Na ilustração acima, por exemplo, o monumento como aparecia em 1698 d.C. aos olhos de Cornelis de Bruijn, um artista e viajante holandês. Os que defendem tais mecanismos acreditam que eles são suficientes para explicar a deterioração da estátua e de suas paredes dentro do prazo dos últimos 4500 anos.

O contra argumento de Shoch, nesse caso, é o de que até recentemente o lençol de água se manteve muito abaixo dos muros circundantes para que pudesse umidecer a areia por baixo e se transformar num fator sério de deterioração. Ele pondera que caso as inundações do Nilo tivessem sido suficientemente severas para desgastar a esfinge diretamente, teriam danificado o monumento por baixo, o que não ocorreu. Ele ainda afirma que os danos foram maiores nos estratos superiores, mais duráveis, do corpo principal do animal. Isto é mais consistente com a ação física das chuvas do que com os efeitos químicos descritos por seus críticos. Por outro lado, há evidências de danos causados à esfinge e seus templos pela condensação, mas tais danos deveriam ser comuns a todas as estruturas de pedra calcária do planalto de Gizé, mas nenhuma outra superfície mostra o mesmo tipo de desgaste que pode ser visto nos muros da esfinge. Além disso, no entender de Schoch, esta é uma causa de deterioração menos importante e não pode ser responsabilizada pela natureza e severidade dos padrões de desgaste da esfinge e seus templos. Embora eu não negue — diz ele — que o crescimento dos cristais de sal estejam realmente danificando a esfinge e outras estruturas nos dias atuais, este mecanismo não explica os antigos padrões de degradação observados no corpo da esfinge e na área que a cerca, mas virtualmente em nenhuma outra parte do planalto de Gizé.

O argumento de Schoch de que a erosão era maior nas partes superiores dos muros ao redor da esfinge foi rebatido por seus opositores com a afirmação de que, na realidade, tal desgaste nunca existiu, simplesmente porque os muros já haviam sido construídos inclinados para trás, num ângulo de cerca de 80 graus. Só se as camadas de pedra calcária estivessem em posição totalmente vertical o desgaste maior nos estratos superiores indicariam claramente que a causa era a chuva. Schoch replica afirmando que ele nunca afirmou que os muros tivessem sido absolutamente verticais em sua origem, mas que mesmo levando em consideração uma pequena inclinação, permanece o fato de que camadas mais duras do topo do muro foram em geral mais escavadas pela erosão do que camadas mais macias situadas mais abaixo.

Quanto às diferenças entre o desgaste da esfinge e o da tumba de Debehen, os críticos afirmam que elas resultam de desigualdades na estrutura geológica das subcamadas das pedras. Em pedras cujas subcamadas vão passando gradualmente de uma consistência mais dura para outra mais macia, acontece um arredondamento horizontal mais suave com o desgaste provocado seja pelo vento, seja pela chuva. Já nas pedras que passam de forma abrupta do mais duro ao mais macio, aparece o perfil mais denteado que Schoch atribuiu ao vento. Seria por isso, e não pela diferença dos agentes — chuva ou vento —, que a rocha da fachada da tumba de Debehen mostra angulosidades, ao mesmo tempo em que ao longo de seu topo os perfis da pedra são arredondados. De maneira geral e mais simplificadamente, Schoch foi criticado porque estaria comparando camadas de rocha com estruturas geológicas diferentes como se fossem iguais. John West contra argumenta invocando o parecer de um geólogo egípcio consultado, em um documentário de TV, sobre a afirmativa de que a rocha da tumba não é a mesma da esfinge. Segundo esse especialista, a tumba pertence à mesma camada do corpo da esfinge. Sendo assim, o desgaste da esfinge e o da tumba deveriam ter sido semelhantes se ambas datassem da mesma época.

Do ponto de vista arqueológico não existem evidências literárias ligando a esfinge diretamente ao faraó Kéfren, mas evidências arquitetônicas parecem indicar que ela fez parte do complexo funerário daquele rei. Ligado ao Templo do Vale existe a calçada que leva até a pirâmide e o muro que cerca a esfinge no lado sul segue o trajeto dela e sugere, por seu ângulo oblíquo, que ele foi escavado depois que a calçada foi construída ou pelo menos projetada. Outro indício é o fato do salão principal do Templo da Esfinge ser quase idêntico ao salão principal do Templo Mortuário de Kéfren. Os blocos do núcleo do Templo da Esfinge combinam com alguns dos estratos do leito de rocha dos muros que a circundam e mostram que o templo foi erguido enquanto ia sendo escavada a região ao redor. Deduziu-se que se outras estruturas do complexo de Kéfren e o Templo da Esfinge datam da mesma época, então a escavação da própria esfinge também deve datar daquela ocasião. Na visão de Schoch, a semelhança entre o salão principal do Templo da Esfinge e o salão principal do Templo Mortuário e os demais argumentos que tentam provar que a esfinge faz parte do complexo de Kéfren não excluem a possibilidade de ter havido duas fases na construção do monumento e dos templos próximos.

A afirmativa de que durante o Império Antigo foram aplicadas pedras deESFINGE EM 1737 revestimento sobre um monumento já muito antigo na época é rebatida pelo Dr. Zahi Hawass, arqueólogo responsável pela supervisão e controle de todas as escavações no Egito, segundo o qual o revestimento foi aplicado como parte da construção original e não é um acréscimo com finalidade de reparação da esfinge. A pedra subjacente não era adequada para ser modelada satisfatoriamente e, então, foi simplesmente cortada de modo rústico e revestida com blocos de pedra polida. Apenas a cabeça, o pescoço e a barba foram cortados na pedra original e deixados expostos sem revestimentos. O desgaste da esfinge desde os tempos do Império Antigo deve ter ocorrido onde as pedras originais do revestimento caíram, o que aconteceu com muitas delas. Hawass admite que restauradores do Império Novo podem ter acrescentado alguns blocos de revestimento cortados no estilo do Império Antigo. Também se argumentou quanto a este aspecto da teoria que os egípcios não costumavam dar acabamento liso para as pedras de granito no lado que não ficaria visível. Seria um trabalho exaustivo e desnecessário. Da mesma forma, parece extremamente improvável que a pedra de granito, mais dura, fosse cortada para se ajustar à pedra calcária, mais macia, e a lógica indica que deve ter sido feito exatamente o contrário. Portanto, os blocos internos de pedra calcária do Templo do Vale de Kéfren foram trabalhados para permitir um ajuste da cobertura granítica. O material interno não foi terminado com perfeição, nem era da melhor qualidade, já que seria escondido pela cobertura. Além disso, o granito do revestimento foi reposto em modernas restaurações, o que obscurece ainda mais a situação nos dias atuais. Na foto acima, desenho feito em 1737 por Frederic Louis Norden, um capitão naval e explorador dinamarquês.

Um forte argumento que se ergueu contra a teoria de West e Schoch foi a ausência de uma civilização e de um governo conhecido na época em que eles pretendem que a esfinge tenha sido construída. Os egípcios daquela época eram primitivos e não teriam condições de construir um monumento de tal envergadura. Schoch respondeu que centros urbanos existiram no mediterrâneo oriental em Catal Huyuk, na Turquia, no sétimo milênio e em Jericó, na Palestina, no nono milênio antes de Cristo. A cidade turca, construída de tijolos de lama e madeira, não era nenhum assentamento primitivo. Ao contrário, os restos conhecidos demonstram uma sofisticação e opulência que os arqueólogos não imaginavam para um período tão remoto de tempo. Os habitantes construíram casas e santuários elaborados, cobriram as paredes com pinturas e relevos e, aparentemente, tiveram uma tradição simbólica e religiosa rica e complexa. Na cidade palestina havia grandes paredes de pedra, uma torre e um fosso. O que sobrou da parede de pedra tem pelo menos dois metros de espessura e ainda conserva, em alguns locais, a altura de seis metros, não se sabendo qual teria sido sua altura máxima. Do lado de fora desta parede protetora foi cavado um fosso no leito de rocha sólido com profundidade de dois metros e setenta centímetros e largura de oito metros e 20 centímetros. Dentro da parede estão os restos de uma torre de pedra com nove metros de diâmetro e as ruínas desta estrutura ainda alcançam nove metros de altura. No centro da torre há um lance de escada construído de enormes lajes de pedra. Esta construção já foi comparada às torres existentes nos grandes castelos medievais da Europa. A evidência de Jericó, particularmente, — conclui Schoch — sugere que o complexo da esfinge, a escultura e seus templos de pedra associados, não teriam sido um fenômeno totalmente isolado no mundo Neolítico: outras volumosas estruturas de pedra estavam sendo construídas ao redor do Mediterrâneo tão remotamente quanto 10000 anos atrás.

Embora nada parecido tenha sido encontrado no Egito, é claro, ainda segundo o raciocínio do pesquisador, que havia civilização na região e as evidências poderiam estar debaixo de milênios de lodo não escavado do Nilo. Também pode ter ocorrido que a elevação do nível do mar desde cerca de 10000 ou 15000 anos atrás tenha submergido vastas extensões ao longo da costa mediterrânea, eventualmente habitadas por culturas anteriores. Além disso — acrescenta Schoch —, uma civilização avançada pode não ter sido necessária: uma cultura neolítica conseguiu erguer Stonehenge na Inglaterra. Haveria algum sinal da existência de uma cultura do tipo daquela que existiu em Stonehenge nas cercanias de Gizé? Por volta de 1995 surgiram evidências de uma cultura neolítica em Nabta Playa, um local situado a oeste de Abu NABTA PLAYA Simbel, no Alto Egito, que atualmente forma a parte sul do deserto ocidental egípcio e que vemos na foto acima. Ali, restos megalíticos demonstram que seres humanos construiam no Egito estruturas de pedra antes de 5000 a.C. Um outro indício aparece na chamada Paleta Líbia, mostrada na foto abaixo, que deve ter sido esculpida entre 3100 e 3000 a.C., no Período Pré-dinástico. Ela simboliza cidades fortificadas ao longo da margem ocidental do delta do Nilo, LIBYAN PALETTE as quais podem ter abrigado obras de arquitetura em pedra, em data bastante remota. Por tais vestígios, Schoch considera bastante provável que o trabalho arquitetônico em pedra tenha existido em Gizé antes de 2800 ou 3000 a.C.

Os críticos afirmam que o calendário circular de pedra em Nabta Playa tinha só quatro metros de diâmetro e não pode ser tomado como evidência das habilidades dos trabalhadores da pedra que estão claramente presentes na esfinge e seu templo. A escala dos dois monumentos não poderia ser mais diferente. Ao contrário do Templo da Esfinge, do Templo do Vale de Kéfren e da própria esfinge, formados por pedras cuidadosamente cortadas e ajustadas, o círculo de Nabta é construído com blocos cortados de forma grosseira. Um certo número de grandes pedras talhadas foram achadas enterradas na areia de Nabta Playa mas, apesar destes monólitos apresentarem algumas características avançadas de trabalho em pedra, não representam verdadeira obra de cantaria e não podem ser considerados como comparáveis com a esfinge e as estruturas a ela associadas.

Dizem ainda os analistas que nos arredores de Gizé os restos pré-dinásticos só surgem depois de 4000 anos a.C. e que não há qualquer evidência clara de que a cultura do trabalho em pedra de Jericó tenha se espalhado para o Egito. A evidência disponível sugere que os habitantes do vale do Nilo antes de 5000 anos a.C. formavam apenas um agrupamento de caçadores. As aptidões das culturas desse tempo estão bem estabelecidas e claramente não incluem o trabalho em pedra. West acredita que a existência de uma cultura pré-histórica capaz de construir monumentos com pedras gigantescas — se pudesse ser provada — criaria uma nova abertura para as interpretações não convencionais do pensamento egípcio. Seja como for, a teoria de John Anthony West levantou novamente a questão da existência de uma civilização desaparecida, possivelmente a Atlântida da antiga lenda. Mesmo que se prove que a esfinge é anterior ao que se pensa, isso não prova a veracidade das lendas, mas coloca na ordem do dia a pergunta que não quer calar: quem construiu a esfinge e por quê?